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terça-feira, 28 de setembro de 2010

grandes momentos da filosofia (freud)

"O material psicanalítico, incompleto como é e não passível de uma interpretação clara, admite, não obstante, uma conjectura – que soa como fantástica – sobre a origem dessa realização humana. É como se o homem primitivo tivesse o hábito, quando entrava em contato com o fogo, de satisfazer um desejo infantil a ele vinculado, extinguindo-o com um jorro de sua urina. As lendas de que dispomos não deixam margem dúvidas quanto à visão originalmente fálica que se tinha das línguas de chama, quando elas se erguem. Extinguir o fogo pela micção – tema a que gigantes modernos, Gulliver em Liliput e o Gargântua de Rabelais, ainda retornam – era, portanto, uma espécie de ato sexual com um indivíduo do sexo masculino, um gozo da potência sexual numa competição homossexual. A primeira pessoa a renunciar a esse desejo e a poupar o fogo pôde conduzi-lo consigo e submetê-lo a seu próprio uso. Apagando o fogo de sua excitação sexual, domara a força do outro fogo. Essa grande conquista cultural foi assim a recompensa de sua renúncia ao instinto. Ademais, é como se a mulher tivesse sido indicada como guardião do fogo que era mantido cativo na lareira doméstica, porque sua anatomia lhe tornava impossível render-se à tentação desse desejo. Notável, também, é a regularidade com que a experiência analítica dá testemunho da conexão existente entre ambição, fogo e erotismo uretral."

(FREUD, Sigmund. O Mal-Estar na Civilização, Parte III, nota 26)