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segunda-feira, 29 de novembro de 2010

violência no rj

"A tradição dos oprimidos nos ensina que o 'estado de exceção' em que vivemos é na verdade a regra geral. Precisamos construir um conceito de história que corresponda a essa verdade. Nesse momento, perceberemos que nossa tarefa é originar um verdadeiro estado de exceção; com isso, nossa posição ficará mais forte na luta com o fascismo. Este se beneficia da circunstância de que seus adversários o enfrentam em nome do progresso, considerado como uma norma histórica. O assombro com o fato de que os episódios que vivemos no século XX 'ainda' sejam possíveis, não é um assombro filosófico. Ele não gera nenhum conhecimento, a não ser o conhecimento de que a concepção de história da qual emana semelhante assombro é insustentável."

(BENJAMIN, Walter. Sobre o Conceito de História (Tese 8). In: Magia e Técnica, Arte e Política: ensaios sobre literatura e história da cultura. Trad. Sérgio Paulo Rouanet. Prefácio de Jeanne-Marie Gagnebin. 7a. ed. SP: Brasiliense, 1994, p.226.

Walter Benjamin escreveu isso em 1940, na Alemanha. Suicidou-se no mesmo ano, encurralado pelo exército nazista.

violência no rj

O estado de defesa, segundo a Constituição

"Artigo 136: O presidente da República pode, ouvidos o Conselho da República e o Conselho de Defesa Nacional, decretar o estado de defesa para preservar ou prontamente restabelecer, em locais restritos e determinados, a ordem pública ou a paz social ameaçadas por grave e iminente instabilidade institucional ou atingidas por calamidades de grandes proporções na natureza.

§ 1º O decreto que instituir o estado de defesa determinará o tempo de sua duração, especificará as áreas a serem abrangidas e indicará, nos termos e limites da lei, as medidas coercitivas a vigorarem, dentre as seguintes:

I – restrições aos direitos de:

a) reunião, ainda que exercida no seio das associações;

b) sigilo de correspondência;

c) sigilo de comunicação telegráfica e telefônica;

II – ocupação e uso temporário de bens e serviços públicos, na hipótese de calamidade pública, respondendo a União pelos danos e custos decorrentes.

§ 2º O tempo de duração do estado de defesa não será superior a trinta dias, podendo ser prorrogado uma vez, por igual período, se persistirem as razões que justificam a sua decretação.

§ 3º Na vigência do estado de defesa:

I – a prisão por crime contra o Estado, determinada pelo executor da medida, será por este comunicada imediatamente ao juiz competente, que a relaxará, se não for legal, facultado ao preso requerer exame de corpo de delito à autoridade policial;

II – a comunicação será acompanhada de declaração, pela autoridade, do estado físico e mental do detido no momento de sua autuação;

III – a prisão ou detenção de qualquer pessoa não poderá ser superior a dez dias, salvo quando autorizada pelo Poder Judiciário;

IV – é vedada a incomunicabilidade do preso.

§ 4º Decretado o estado de defesa ou sua prorrogação, o Presidente da República, dentro de vinte e quatro horas, submeterá o ato com a respectiva justificação ao Congresso Nacional, que decidirá por maioria absoluta.

§ 5º Se o Congresso Nacional estiver em recesso, será convocado, extraordinariamente, no prazo de cinco dias.

§ 6º O Congresso Nacional apreciará o decreto dentro de dez dias contatos de seu recebimento, devendo continuar funcionando enquanto vigorar o estado de defesa.

§ 7º Rejeitado o decreto, cessa imediatamente o estado de defesa."

A intervenção, segundo a Constituição

CAPÍTULO VI

DA INTERVENÇÃO

Art. 34. A União não intervirá nos Estados nem no Distrito Federal, exceto para:

I - manter a integridade nacional;

II - repelir invasão estrangeira ou de uma unidade da Federação em outra;

III - pôr termo a grave comprometimento da ordem pública;

IV - garantir o livre exercício de qualquer dos Poderes nas unidades da Federação;

V - reorganizar as finanças da unidade da Federação que:

a) suspender o pagamento da dívida fundada por mais de dois anos consecutivos, salvo motivo de força maior;

b) deixar de entregar aos Municípios receitas tributárias fixadas nesta Constituição, dentro dos prazos estabelecidos em lei;

VI - prover a execução de lei federal, ordem ou decisão judicial;

VII - assegurar a observância dos seguintes princípios constitucionais:

a) forma republicana, sistema representativo e regime democrático;

b) direitos da pessoa humana;

c) autonomia municipal;

d) prestação de contas da administração pública, direta e indireta.

e) aplicação do mínimo exigido da receita resultante de impostos estaduais, compreendida a proveniente de transferências, na manutenção e desenvolvimento do ensino e nas ações e serviços públicos de saúde. (Redação dada pela Emenda Constitucional nº 29, de 13/09/00)

Art. 35. O Estado não intervirá em seus Municípios, nem a União nos Municípios localizados em Território Federal, exceto quando:

I - deixar de ser paga, sem motivo de força maior, por dois anos consecutivos, a dívida fundada;

II - não forem prestadas contas devidas, na forma da lei;

III – não tiver sido aplicado o mínimo exigido da receita municipal na manutenção e desenvolvimento do ensino e nas ações e serviços públicos de saúde; (Redação dada pela Emenda Constitucional nº 29, de 13/09/00)

IV - o Tribunal de Justiça der provimento a representação para assegurar a observância de princípios indicados na Constituição Estadual, ou para prover a execução de lei, de ordem ou de decisão judicial.

Art. 36. A decretação da intervenção dependerá:

I - no caso do art. 34, IV, de solicitação do Poder Legislativo ou do Poder Executivo coacto ou impedido, ou de requisição do Supremo Tribunal Federal, se a coação for exercida contra o Poder Judiciário;

II - no caso de desobediência a ordem ou decisão judiciária, de requisição do Supremo Tribunal Federal, do Superior Tribunal de Justiça ou do Tribunal Superior Eleitoral;

III de provimento, pelo Supremo Tribunal Federal, de representação do Procurador-Geral da República, na hipótese do art. 34, VII, e no caso de recusa à execução de lei federal. (Redação dada pela Emenda Constitucional 45 de 30/12/2004)

IV - (Revogado pela Emenda Constitucional 45 de 30/12/2004)

§ 1º - O decreto de intervenção, que especificará a amplitude, o prazo e as condições de execução e que, se couber, nomeará o interventor, será submetido à apreciação do Congresso Nacional ou da Assembléia Legislativa do Estado, no prazo de vinte e quatro horas.

§ 2º - Se não estiver funcionando o Congresso Nacional ou a Assembléia Legislativa, far-se-á convocação extraordinária, no mesmo prazo de vinte e quatro horas.

§ 3º - Nos casos do art. 34, VI e VII, ou do art. 35, IV, dispensada a apreciação pelo Congresso Nacional ou pela Assembléia Legislativa, o decreto limitar-se-á a suspender a execução do ato impugnado, se essa medida bastar ao restabelecimento da normalidade.

§ 4º - Cessados os motivos da intervenção, as autoridades afastadas de seus cargos a estes voltarão, salvo impedimento legal

http://ultimainstancia.uol.com.br/noticia/27895.shtml

domingo, 28 de novembro de 2010

os livros

http://www.4shared.com/document/8VBjCYVG/Os_Livros.html

benjamin

ESTADO DE EXCEÇÃO

“Terra de ninguém”, “zona incerta”, “zona de indeterminação”, “conceito-limite da ordem jurídica”, o estado de exceção tende, cada vez mais, a constituir o paradigma dominante de governo na política contemporânea . É o que defende o filósofo italiano Giorgio Agamben em seu último livro, Estado de exceção, publicado recentemente no Brasil.

Este seria o “Homo Sacer II”, volume que dá seqüência às reflexões feitas em Homo Sacer I— O poder soberano e a vida nua (Editora da UFMG, 2002), sobre o campo de concentração como paradigma biopolítico moderno. O ponto de partida para a retomada da discussão são as leis promulgadas nos Estados Unidos em 2001 para combater o terrorismo, por meio das quais a política revela o que seria sua estrutura originária: o banimento — que reduz o homem à sua condição animal, desprovida de direitos — e as medidas excepcionais e provisórias, tomadas em situações de “necessidade” ou de “emergência”. A partir de então, Agamben adverte, a exceção pode estar se tornando regra.

Ele descreve a base norte-americana da baía de Guantánamo, em Cuba, como “vida nua em sua máxima indeterminação”: mais de 500 “detentos” (detainees), em sua maioria talibãs — muçulmanos de posições extremadas —, sofrem abusos, inclusive sexuais. Ficam sujeitos à vigilância militar permanente, passam grande parte do tempo encapuzados, de mãos atadas, aguardando o chamado para depor diante das comissões (e não tribunais) militares. É-lhes vedada qualquer defesa legal. Sem direito ao estatuto de “acusado”, segundo as leis norte-americanas, sem direito a tratamento como “prisioneiros de guerra”, segundo a Convenção de Genebra, seus destinos cabem às mais altas instâncias do governo dos EUA. A detenção de que são objeto é indeterminada quanto ao tempo e também quanto à própria natureza — “totalmente fora da lei e do controle judiciário”. Só haveria uma comparação possível: a situação dos judeus nos campos de concentração nazistas. Afinal, o Terceiro Reich pode ser considerado, juridicamente, um estado de exceção que durou 12 anos.

segunda divisão


ano que vem, dérbi em campinas.. kkkkk

sexta-feira, 26 de novembro de 2010

cine-rock, 27-11


Ufal - Arapiraca, 14 hs

(na ocasião, será também discutida a organização da festa do dia 03/12, no RU)














quinta-feira, 25 de novembro de 2010

adão

violência no rj

Revista Carta Maior

19/05/2006 - 15h59
"Estão escondendo os corpos porque é tudo execução"

Bia Barbosa - Carta Maior

Em entrevista à Carta Maior, o escritor Ferréz denuncia onda de matança na periferia: "Estão escondendo os corpos porque é tudo execução, com tiro na cabeça. Hoje os policiais estão desfilando aqui na rua com touca ninja e camisa Le Coq, que é um grupo de extermínio da polícia"

SÃO PAULO - O balanço divulgado na noite de quinta-feira (18) pela Secretaria de Segurança Pública do governo de São Paulo totaliza em 152 o número de mortos na onda de violência que atingiu o estado na última semana. Destes, 107 foram mortos pela polícia em supostos confrontos. Muitos ainda não tiveram seus nomes divulgados e dezenas de corpos estão no IML (Instituto Médico Legal) a espera de identificação. Na quarta-feira, tiveram início as primeiras denúncias de que a polícia estaria cometendo abusos no combate aos ataques do PCC, o Primeiro Comando da Capital. Casos que começaram a estampar as páginas dos jornais e que agora não pararam de chegar às organizações de defesa dos direitos humanos.

Na quinta-feira, o escritor Ferréz fez um apelo à população em seu blog, para que todos ajudassem a divulgar que "a Policia Militar e a Policia Civil, afetadas com a onda de matança, estão fazendo da nossa periferia um estado pra lá de nazista". "Não está acontecendo confronto, e isso é uma prova que todos vão ter em alguns dias, quando a mídia começar a ir atrás de novas notícias e decidir falar a verdade. Não adianta ofender, não adianta ameaçar, a boca só se cala quando a guerra não for injusta", escreveu.

Reginaldo Ferreira da Silva - o nome literário é uma homenagem a Virgulino Ferreira da Silva, o Lampião (Ferre), e a Zumbi dos Palmares (Z) - nasceu no Capão Redondo. O bairro, na Zona Sul de São Paulo, é considerado uma das regiões mais violentas da capital. Filho de um motorista e de uma empregada doméstica, ele escreveu os primeiros versos aos sete anos de idade. Trabalhou como chapeiro numa lanchonete, balconista em bar e padaria, foi vendedor ambulante de vassouras e auxiliar-geral numa empresa metalúrgica antes de publicar suas primeiras obras. É autor de Fortaleza da Desilusão, Capão Pecado e Amanhecer Esmeralda. Em 1999, fundou a 1DASUL, um movimento que promove eventos culturais em bairros da periferia. E, em 2001, lança a revista Literatura Marginal, em parceria com a revista Caros Amigos, que recebe o Prêmio da Associação Paulista de Críticos de Arte de Melhor Projeto de Literatura.

Firme e forte, como "um elo da corrente", como ele sempre escreve, Ferréz concedeu à Carta Maior a entrevista abaixo:

Carta Maior - Você denunciou em seu blog que a polícia matou quatro jovens inocentes esta semana no Capão Redondo. Como isso aconteceu?

Ferréz - Todos os dias de manhã, eu vou a um bar tomar café. O bar fica em frente a uma pequena loja de camisetas que eu tenho lá na rua. Todos os dias eu via esses meninos lá. Um deles vendia flor, o outro, produtos de limpeza. Estão sempre lá tomando café também antes de irem trabalhar. Na segunda-feira, cheguei no bar e estava um movimento estranho. E aí me falaram que os caras tinham atirado nos meninos no domingo à noite. Eles estavam tomando cerveja numa barraca de lanches. Isso foi numa rua próxima, onde todo mundo sempre vai. Um lugar conhecido no bairro. Chegou um carro preto - alguns moradores disseram que viram uma viatura também -, desceram cinco homens de toca ninja e atiraram nas pessoas na barraca. Até o dono foi alvejado. Quatro morreram e três estão no hospital ainda. Um se chamava Maurício e o outro, Brigadeiro. Mas a polícia não divulgou ainda o nome dos mortos. O mais velho tinha 27 anos e nenhum estava envolvido com o crime. Dos três que estão hospitalizados, nenhum tinha passagem pela polícia. No Parque Ipê, que é uma favela, colocaram fogo na moto de um menino que entregava pizza. Ele também morreu. Invadiram as casas das pessoas, uma por uma. Invadiram as casas no meio da madrugada.

CM - Nesta quinta-feira, a polícia realizou uma operação com 400 homens na favela do Elba, usando um mandado coletivo de busca. O que você acha dessas operações?

Ferréz - O estranho disso tudo é que não foi a população que declarou guerra à polícia militar. Foi o PCC. E quem está pagando é a população. A polícia recebe coação há tempos dos bandidos; ela criou este estado. E agora está guerreando com isso, porque solta as pessoas com alto grau de periculosidade. E quem paga é o povo, porque o cara do PCC não fica moscando na rua de bobeira. Aí a polícia pega o popular, confunde com outra coisa, e ripa o pessoal da favela. Tinha que ter mandado coletivo em Brasília, porque lá já foi provado que as pessoas são criminosas. Mas é mais fácil entrar na casa da população e bater num pobre do que olhar no olho de um ladrão, porque eles tremem quando isso acontece.

CM - Tremem por quê? Você acha a polícia despreparada?

Ferréz - A polícia tem vontade de fazer alguma coisa e acaba fazendo com as pessoas, por despreparo dos policiais. As pessoas que estão morrendo agora não são culpadas. Me revoltei por isso. Por que é assim, matou e enterrou? A vida do cara é isso? Espera aí! O cara foi assassinado e isso não vai ser investigado porque ele é pobre? A polícia científica esteve no lugar em que os meninos morreram e começaram a perguntar pras pessoas se eles eram "nóia". Ou seja, estavam procurando alguma razão pra justificar depois as mortes. Este é o único país em que o morto é culpado. Você morre e ninguém investiga. Estamos recebendo várias cartas de outras pessoas denunciando isso. Não é possível que todos estejam mentindo. Não é possível que fique assim. Estão escondendo os corpos porque é tudo execução, com tiro na cabeça. Hoje os policiais estão desfilando aqui na rua com toca ninja e camisa Le Coq, que é um grupo de extermínio da polícia.

CM - Mas não é de agora que há denúncias de grupos de extermínio agindo na periferia com a participação de policiais. Em que a situação atual diferente da de antes?

Ferréz - Apanhar da polícia não é novidade. A polícia sempre pega as pessoas, bate, espanca, não acha nada e fica nervosa. A PM pega as pessoas e diz que elas são lixo, dão bronca porque não têm roupa, porque estão "desarrumados". Muitas pessoas acham isso estranho porque moram do outro lado da cidade, onde os cidadãos são tratados como seres humanos. Aqui é diferente. Mas chacina não tinha há muito tempo. Um cara entrar na viatura e sumir sempre tem. Mas chacina do jeito que está não tinha. E a mídia não reportou a chacina. Como 107 podem ser mortos suspeitos? Depois que a pessoa morre, como é que você recupera a vida dela?

CM - Como está sendo a atuação da polícia esses dias no Capão Redondo?

Ferréz - Estão pegando qualquer um que tenha ficha. Se tiver passagem, apanha. Tenho um amigo que foi solto há dois anos, estava trabalhando, sossegado. A polícia pegou a ficha dele e veio atrás. No sábado, ele foi às Casas Bahia pagar uma conta e, quando voltou, a polícia o seguiu, o pegou, levou e bateu muito nele. Deu choque, bateu com pedaço de pau. Ele estava com outro amigo. Depois foi solto. Agora ele não sai de casa mais, está super nervoso, não conversa com ninguém. Está revoltado de novo, porque estava trabalhando sossegado. Mas é assim que você cria uma fábrica de fazer vilão, pegando pessoas que não tem nada a ver. A guerra é entre o PCC e eles, e não com a população. Não temos que pagar por isso, não lucramos nada com isso.

CM - Diante do quadro histórico do país, você acha que essa crise de violência demorou para explodir aqui em São Paulo?

Ferréz - Essa situação existe há muito tempo e as pessoas não queriam ver. Há quatro anos publiquei um artigo na Folha de S.Paulo que já falava isso. Era pela guerra e pelo terror ou pela arte. Ninguém tem arte, cultura, informação. A prisão não reeduca, só repreende. O caminho é esse, o Estado vai se fortificando e já era. Mas hoje o Estado está submisso. Tinha que fazer política pública de segurança de verdade, e não brincar com a população. O Furukawa [secretário de Administração Penitenciária] e o Saulo [Abreu de Castro, secretário de Segurança Pública] estão brincando há muito tempo, até com a vida dos policiais, que estão abandonados. O cara está na rua, no combate corpo-a-corpo e não tem preparo, não tem curso, não aprende. Aí fica um brutamonte contra o outro na rua, e nós no meio, desarmados, querendo trabalhar.

CM - As pessoas estão conseguindo trabalhar esses dias?

Ferréz - As pessoas estão arriscando a vida para trabalhar. Tenho dois cunhados que voltam de noite pra casa, se arriscando. Mas as pessoas têm que ganhar o pão delas. O comércio aqui está fraco, está um clima estranho, as pessoas não saem de casa.

CM - Os senadores e deputados em Brasília devem aprovar nos próximos dias um pacote de leis para aumentar o combate à criminalidade. Há propostas com forte linha repressora. Você acha que este é o caminho?

Ferréz - Acho que o Estado está fazendo corda pra se enforcar. A elite já é suicida há muito tempo e agora o Estado está sendo. Quando você reprime uma criança no primeiro dia, ela sorri pra você. No segundo, já faz uma cara de desconfiada. No terceiro, ela te olha de cara feia. Tenho um amigo que diz que diz que quando você prende um cachorro e todo dia o chuta um pouco, quando você o solta ele te morde, e não te faz carinho. O sistema carcerário é a mesma coisa. Ele tem que ser uma tentativa de restabelecer o convívio do preso, e não só a sua punição. Quando ele for pra rua, vai reagir. Acho que essas leis são um tiro na testa. A questão do Brasil é de educação, desde o primeiro ano. Só que ninguém faz nada. Todo mundo que é um pouco mais esclarecido sabe que o negócio é mais embaixo. Mas infelizmente a coisa vai sendo levada na brincadeira. Essas leis de agora são medidas políticas, que fazem um governo aqui brilhar mais do que o de lá.

CM - Você falou que a elite é suicida há muito tempo. Por quê?

Ferréz - Em um estado onde uma pessoa tem milhões e a outra não tem o que comer no dia, esses mundos acabam se encontrando um dia. E é claro que vão se encontrar, porque é a gente que limpa a casa deles, que cuida da segurança deles, que dirige o carro deles. Não tem como um cara carregar uma carroça o dia inteiro e ver um Audi ali do lado, com um cara no ar condicionado confortável, e dar tchauzinho. As pessoas vão tomando ódio, porque querem que o seu filho também tenha respeito e educação, querem que o posto de saúde funcione, que os policiais não entrem na sua casa. Não é brincadeira. O dia em que a população estiver conscientizada, não vai ter como conter isso. Vai chegar uma hora que o povo vai gritar. Falamos que o brasileiro é pacato, mas quando a bomba explode, olha o que acontece? As pessoas trabalham doze horas por dia e não têm pão pra colocar na mesa. Isso é culpa de quem, do pobre?

CM - O governador Cláudio Lembo deu uma entrevista para a Folha de S.Paulo em que responsabilizou a elite sobre o que está acontecendo. O que você acha disso?

Ferréz - Todo cara da elite retrata a elite como se fosse o outro. A elite sempre é o cara que tem mais do que eu. Eu tenho pouca terra, tenho pouca Mitsubishi, pouco Chrysler. Mas elite é o outro, que tem iate. A elite não se enxerga como elite. Ninguém é culpado...

CM - Você é de uma região que já foi considerada uma das mais violentas do mundo. Ainda há um estigma da classe média e da classe alta em relação à população da periferia?

Ferréz - Pra mim, muita gente da classe média e da classe alta também é ladrão. Vivem explorando os outros. Eu acho que tínhamos que abrir a conta dessas pessoas, fazer uma reviravolta no passado delas. Os bancos estão ganhando 60% de lucro por ano num país que é miserável. Algo está errado. Não é à toa que queimaram as agências bancárias. Depois falam que o crime não está politizado. Tem coisa mais politizada que queimar agência bancária?

CM - Há regiões da cidade em que a população diz que tem mais medo da polícia do que dos criminosos, porque não sabe que tipo de comportamento esperar dos policiais. Você concorda com isso?

Ferréz - Sim. A farda causa uma coisa estranha. Você conversa com um policial num dia e, no outro, se ele passa na viatura, nem fala com você. Tem uns policiais do bairro que vão na minha loja, pedem desconto, e no dia em que estão fardados nem me olham na cara. Não não existe polícia que sorri pra uma criança, que fale bom dia. A polícia comunitária é uma piada. Nunca vi isso, é um fracasso. É a mesma arrogância e prepotência; não mudou nada. Já os bandidos mataram apenas um civil, a namorada do policial, porque ele bateu o carro e ela estava dentro. Pelo lado dos policiais, quantas pessoas morreram? Acho que a máscara vai cair uma hora. Quando divulgarem os nomes, vão ver que muitas das pessoas não têm passagem, não têm nada a ver com a coisa. Isso se contarmos somente as mortes que foram assumidas, porque o IML falou que está cheio de cadáveres que não há como identificar. E os massacres que não entraram no índice? Além da morte desses quatro meninos, um outro morreu no Parque Santo Antônio e mais dois foram atingidos num campo de futebol. A viatura chegou, os caras saíram de touca ninja, mandaram os caras que estavam conversando no campo à noite se ajoelharem e atiraram nos moleques. Um morreu e o outro está no hospital. De dia são as abordagens pra bater. De noite, o bicho está pegando.

CM - Esta noite não houve mortes, pelo menos divulgadas. Você acha que a situação se acalmou?

Ferréz - Não sei. Estou como a população de São Paulo. Sem saber o que vai acontecer

http://noticias.uol.com.br/ultnot/brasil/2006/05/19/ult2041u173.jhtm

zé simão

"Riolência! Agora estão queimando até ônibus! Só falta o Pão de Açúcar entrar em erupção!"
(Folha de SP, 25/11/10)

violência no rj

UOL News – Lilian Witte Fibe entrevista Nancy Cardia, do Núcleo de Estudos de Violência da USP

18/05/2006 - 18h50

Violência em SP: "Nada garante que essas tragédias não piorarão", alerta psicóloga social

A violência nas ruas da cidade de São Paulo aparentemente diminuiu. Ônibus, no entanto, continuam sendo incendiados, o que mantém a população amedrontada. O diretor do Departamento de Investigações sobre o Crime Organizado, Godofredo Bittencourt, em entrevista à rádio CBN, atribuiu os últimos ataques a algo que ele chama de "criminalidade normal da cidade".
À noite, em Osasco, na Grande São Paulo, 11 homens armados atiraram num batalhão da Polícia Militar. Um dos bandidos foi morto, mas dez fugiram. Dez ônibus foram incendiados e a polícia matou nove pessoas entre a noite de ontem e a madrugada de hoje. Numa favela na periferia, um suposto criminoso do Primeiro Comando da Capital, o PCC, foi preso. Drogas, três revólveres calibre 38, uma pistola e uma carabina foram apreendidas.
Durante a madrugada, a TV Bandeirantes exibiu declarações atribuídas a Marcos Camacho, o Marcola, líder do PCC. A emissora informou que o bandido falou através de um celular. Ele negou acordo com o governo, mas ameaçou a cidade com novos ataques.
O governador de São Paulo, Cláudio Lembo, depois de dizer, em entrevista à Folha de S. Paulo, que parte da culpa é de uma "minoria branca", que "tem que abrir a bolsa para sustentar a miséria brasileira", deu uma coletiva hoje de manhã em que pegou mais leve, além de colocar em dúvida a autenticidade da entrevista de Marcola à Bandeirantes. "Não é normal ônibus queimando, ataques a batalhões da PM, entrevista por celular com alguém que está em um regime mais rígido disciplinar, tampouco são normais as declarações que o governador fez", avalia a coordenadora do Núcleo de Estudos de Violência da Universidade de São Paulo, a psicóloga social Nancy Cardia. "Imagino que deve ter muito mais coisa envolvida. Alguém ficou insatisfeito, algum acordo anterior foi rompido, algo muito substancial aconteceu."

Como a população reage?

"A sociedade está numa vulnerabilidade incrível. O máximo que podemos fazer a gente faz: pagamos impostos, nos comportamos dentro da lei, elegemos os representantes para quem delegamos o poder de organizar o funcionamento da sociedade. Cabe a eles criar as condições para que a gente consiga levar o nosso cotidiano", diz a psicóloga, que também é crítica em relação à atuação da polícia. "Suspeito é suspeito, não foi investigado, não foi provada a responsabilidade a respeito de nada, não foi julgado, nem sentenciado. Isso aconteceu informalmente, à margem da lei."
Nancy também analisa o comportamento da maioria das pessoas, que não parece se importar com os mortos sem identificação. "Elas entram em pânico e querem uma solução rápida, pois têm medo de quem é encarregado de aplicar a solução - ao mesmo tempo em que precisam da polícia, não têm confiança - e isso aparece como mal menor. Acrescente a isso a impressão de que os direitos humanos tratam alguma coisa que não é universal. Só posso ter direito a ter direito se eu me comportar dentro de determinado padrão de comportamento."
A psicóloga explica que uma facção como o Primeiro Comando da Capital nasce exatamente para defender os mais fracos da brutalidade que é o sistema carcerário no Brasil - "presídios são inferno em vida" -, além de garantir um mínimo de proteção. "Esse grupo, perversamente, vira uma máquina do crime."

Houve avanços em relação à violência?

"A sociedade está mais consciente sobre as causas da violência, tem uma maior compreensão sobre a necessidade de se prevenir e que, de fato, isso é possível. Por isso surgiram tantos grupos voltados para trabalhar essa questão, como o Instituto São Paulo contra a Violência, o Sou da Paz, o Movimento em Defesa da Vida", diz Nancy. "Mas, simultaneamente, quase triplicamos a população carcerária, um aumento dramático. Tem muita gente cumprindo pena porque é pobre, não teve acesso à ajuda legal, a família é tão carente que não sabe nem onde procurar ajuda."
"A população está entre esses dois pólos", avalia a psicóloga. "Com o tipo de resultado que houve desse episódio, não temos garantia de que não vá se repetir e, pior, caso venha a se repetir, que ele não será muito pior do que a gente viveu anteriormente", alerta Nancy.

http://noticias.uol.com.br/uolnews/brasil/entrevistas/2006/05/18/ult2496u517.jhtm