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segunda-feira, 28 de fevereiro de 2011

oscar

A Origem

A ideia remonta a Solaris (Tarkovski), em que cientistas dentro de uma estação espacial na órbita do estranho planeta do título têm alucinações e enoluquecem, preferindo ficar com as alucinações (a jovem esposa falecida). A Origem exagerou este aspecto, fazendo com que DiCaprio tenha passado 50 anos junto de sua esposa, presos dentro de um sonho, com sua temporalidade específica.

A pergunta da pílula vermelha de Matrix não se reflete na questão do líquido que tem que ser injetado para provocar o sonho (é apenas sonífero? não há nenhuma outra droga misturada?), o que é uma perda em relação ao primeiro filme, que aliás apelou menos para o romantismo, mas, mesmo assim, é uma surpresa ver Dom acordando.

Amnésia (Cristopher Nolan) já demonstrava que a complexidade do roteiro obedece com bastante facilidade a um princípio único. O filme elabora um estilo de temporalidade de trás-pra-frente, ou seja, embora assistíssemos as cenas se desenvolverem normalmente, a montagem das cenas fora invertida e então víamos algumas vezes as mesmas cenas. Mesmo assim, há uma reviravolta no final.

Por outro lado, o desejo de viver os sonhos conscientemente como inclusive em cenários recorrentes que apenas cada sonhador reconhece, resolve o final de Até o Fim do Mundo (Wim Wenders), em que alguns personagens enlouquecem fascinados e viciados em pequenas maquininhas de vídeo em que tinham gravado seus próprios sonhos. A máquina tinha sido um desenvolvimento daquela que o cientista inventara para que sua esposa, cega, pudesse voltar a enxergar. A heroína apenas se desligou de sua máquina quando acabaram as pilhas.

De resto, a separação entre o corpo e a alma também é belamente explorada em Fale com Ela (Almodóvar), quando Benigno, na prisão-hospício, toma uma overdose de remédios para tentar entrar em coma e se encontrar com sua amada, deitada na cama do hospital há meses, configurando assim uma releitura moderna da temática do amor platônico. Há as alucinações de Uma Mente Brilhante... enfim.

Na Filosofia, Descartes levou longe a ideia de abalar a nossa realidade através do “argumento do sonho”, segundo o qual poderíamos estar sonhando em vez de acordado escrevendo isso aqui. O filme A Origem é, de longe, o mais inteligente, o que requer mais da inteligência do espectador. Filmes que apelam apenas para nossas emoções são hegemônicos, muitas vezes aparentemente construídos sem um pingo de labor de roteiristas que delegam toda a criação do enredo aos especialistas em efeitos especiais. Por isso, sem ter visto a maioria dos filmes concorrentes, torço para A Origem. (LSD)