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quinta-feira, 29 de julho de 2010

a televisão

“Parei de ver televisão. Parei de vez, definitivamente, nenhum programa, nem mesmo de esporte. Parei há pouco mais de seis meses, no fim de julho, logo depois do fim da Volta da França. Como todo mundo, assisti tranquilamente à transmissão da última etapa do Tour de France no meu apartamento em Berlim, a etapa de Champs Elysées, que acabou com um sprint de Ouzbèke Abdoujaparov, depois levantei-me e desliguei a televisão. Revejo claramente o gesto que fiz então, gesto muito simples, fácil, mil vezes repetido, meu braço que estica e aperta o botão, a imagem que implode e desaparece da tela. Acabou, nunca mais assisti à televisão.
O aparelho ainda fica na sala, está abandonado e desligado, não toquei nele desde então. Com certeza ainda funciona, bastaria apertar o botão para ver. É um televisor clássico, preto e quadrado, que fica sobre um suporte de madeira laqueada composto por dois elementos, uma tábua e um pé, o pé com forma de um fino livro negro, aberto na vertical, como se fosse uma censura tácita. A tela, de uma cor indefinível, profunda e pouco atraente, para não dizer verde, é levemente convexa. O receptor, que tem do lado um pequeno compartimento para os diferentes botões de comando, é encimado por uma grande antena em forma de V, bastante parecida com as duas antenas de uma lagosta, oferecendo aliás o mesmo tipo de pega, se fosse o caso de se pegar o televisor pelas antenas e mergulhá-lo numa panela de água fervendo para se ver livre dele de modo ainda mais radical.”
(TOUSSAINT, Jean-Philippe. A Televisão. Trad. Ângela Vianna. SP: Ed. 34, 1999. p.7)